sábado, 28 de fevereiro de 2009

...a cidade e os modismos...

Orgulhosa de si, Quatro tem o dom de ser soberana em vários quesitos. Ela certamente é a mais moderna, também é a mais longínqua, a mais representativa, a mais poderosa, a mais bonita, a mais criativa... enfim. Ela se dá o direito de ter palácios para seus reis, catedrais com anjos de verdade, museus com espécies vivas de todos os reinos e pinturas dos artistas mais cobiçados de todos os tempos.
Quatro é assim, sempre foi e sempre será um lugar amaldiçoado que incessantemente busca estar à frente do seu tempo. Não se contenta com a morosidade e tem antipatia ao retrocesso. Vive no presente um futuro que está logo à frente. Executa cada passo na linha cronológica dos acontecimentos feito um guerreiro que, mirando fixamente o horizonte e com passadas decididas, vai ao encontro das batalhas.
Esta cidade realmente é fascinante. Devo confessar que fui atraído pela sua deslumbrante maneira de ser. E não fui o único! Os habitantes da cidade Quatro vivem sob esta ordem quase hipnótica, onde instintivamente criam modismos e caprichos, afirmando constantemente a posição suprema de cultivadores de novidades. Basta recorrer com atenção suas vias, seus átrios e seus descampados que logo surgem as fantasias criadas e incorporadas por seus tipos. Um homem demonstra sua elegância, vestindo saia de chita; uma jovem com tatuagens solúveis espalhadas por braços e pernas; um grupo de fortões bebendo cerveja mais rápido que o próprio ponteiro do relógio; um rapaz sobrevoa a cidade a bordo de uma vassoura encantada.
Fugir do corriqueiro é o grande mandamento ensinado em suas amplas e modernas escolas ao ar livre.
Pergunto-me se de alguma forma Quatro poderia ser, mesmo que num único instante, uma cidade comum, mortal como as demais. Prontamente me vem a certeza que ela nunca terá este prazer. Para se tornar algo trivial, mesmo por um momento muito breve, deverá abrir mão do grande lago radioativo (espaço dos banhos dominicais), necessita encher suas piscinas que nunca viram uma gota de água sequer, precisa encerrar seus concursos de pinturas faciais masculinas e solicitar aos vários sóis que não se apresentem tão magníficos toda manhã.
Porém, se acontecer tais coisas em um único instante, Quatro se dilui no primeiro sopro de ar, se perde, deixa de existir, vira uma lembrança do futuro de outras cidades. Não é mais nada!





Nenhum comentário:

Postar um comentário